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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

DOAÇÃO DE ÓRGÃOS DE ANENCÉFALOS

É licita a retirada de órgãos e tecidos de crianças anencéfalas para transplantes após seu nascimento a termo?
Mesmo que haja o comovente gesto do consentimento materno da criança que vai nascer com esta alteração, é discutível a legalidade e a eticidade daquela conduta, principalmente se levarmos em conta os critérios adotados para o conceito de morte.
Os defensores da utilização de órgãos dos bebês anencéfalos, após o nascimento, admitem não ser necessário esperar a morte do tronco cerebral e a cessação da vida vegetativa autônoma, pois as crianças sem cérebro já foram consideradas cientificamente sem vida e incapazes de existir por si só, quando das sentenças repetidas dos magistrados ao se pronunciarem autorizando o aborto. Muitos chegam até a considerar o anencéfalo como uma criança morta.
Por outro lado, existem, mesmo entre os neurologistas, aqueles que asseguram haver atividade do tronco cerebral nos anencéfalos, os quais sobrevivem por algum tempo mantendo a respiração, os movimentos e a sugação.
A situação torna-se menos delicada quando se sabe que essas crianças, ainda que assegurada uma certa assistência, não apresentam condições para sobreviver por tempo razoável.
Diz-se que a retirada de órgãos de um recém nascido anencéfalo é uma questão que já está contemplada na nossa legislação. No entanto, não podemos esquecer que a norma alusiva à utilização de órgãos e tecidos humanos para transplantes faz referência à morte encefálica, traduzida pelos critérios adotados pelo Conselho Federal de Medicina.
Todo problema está aí. Saber se as condições neurofisiológicas de uma criança que nasce sem parte do cérebro são as mesmas dos critérios apontados pela Resolução do CFM, a qual é clara no que diz respeito á morte ou à falência absoluta e irreversível do tronco cerebral.
Um conceito de morte, sob o ponto de vista biológico, deve estar fundamentado num fato que tenha uma linha divisória irreversível e precisa, marcada por parâmetros semiológicos e técnicos, onde fique bem claro se um indivíduo está vivo ou morto, tudo isso sem qualquer abstração de ordem metafísica.
Diagnosticar a morte não é apenas comprovar a morte de um órgão, mesmo sendo ele importante para a vida. É muito mais comprovar a ausência de funções vitais que evidenciar danos estruturais ou orgânicos.
Alguns princípios tornam-se muito delicados a partir do momento em que tratamos das exceções, transformando-as em "casos especiais" e criando para cada uma delas regras casuística, tão-só para resolver interesses imediatos.
Os anencéfalos nascidos vivos, ainda que tendo uma atividade cerebral muito reduzida, apresentam manifestações de vida organizada e, por isso, dentro dos critérios atuais, seria difícil considerá-los em morte encefálica. Esta, por sua vez, não é um tipo ou uma condição especial de morte, mas um estado definitivo de morte.
E mais. Com certeza, quando essas crianças nascerem serão transferidas para as unidades de cuidados intensivos, submetidas à ventilação eletiva como potenciais doadoras de órgãos, até se encontrar um receptor ideal, nos moldes de verdadeiros armarinhos de estruturas humanas.
Enfim, resta saber se é possível reformular os critérios atuais da definição de morte, considerando-a como a perda irreversível das funções cerebrais superiores, sem levar em conta as funções do tronco cerebral. Isto, no entanto, não deixa de ser temerário - mudar em sentido permissivo, apenas para atender situações limitadas e esporádicas na utilização de estruturas humanas para transplantes. Ou entender que a retirada de órgãos de anencéfalos já acata as recomendações hoje adotadas no protocolo de morte encefálica de recém-nascidos. Ou, finalmente, se tais procedimentos estão ultrapassando os limites tolerados pela ética e pela lei. Dizer, no entanto, que o anencéfalo está mais ou menos morto, é um argumento no mínimo duvidoso.

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